quarta-feira, 24 de junho de 2015

E NA TV MILAGRE NA RUA 34



Por Manoel Vicente Neto

Ela liga a televisão, liga o pisca-pisca, decora a casa, acende as velas na sala de jantar, põe metade de um peru no forno, um panetone e uma garrafa de vinho, uma taça apenas, dois talheres e um prato sob a mesa, sozinha, não espera por ninguém, senta, espera, a televisão está ligada em algum concerto de natal para a televisão, ela não presta atenção... 

Espera pacientemente o peru estar no ponto, desliga o forno, apaga as velas e sai, ao sair deseja para o porteiro feliz natal, ela passeia pela cidade para admirar as pessoas, o vai e vem das pessoas com suas melhores roupas, pequenos shows no centro da cidade ela passa e observa as decorações de natal que para ela nada significa.

Observa cada decoração que a são apenas luzes e cores e não a comove, ela entra nesses supermercados dia e noite, observa o funcionário do caixa com um gorro do papai Noel em pleno verão ela passou por ele contendo o riso, ele percebeu quis rir também, mas ela não podia  permite- se ser alegre nesse dia e ele também tentou conter o riso e ficou envergonhado, ela foi direto para a seção de frios comprou o queijo que ela tinha esquecido, pagou ao caixa o valor devido e depositou uma boa quantia na caixinha dos funcionários, o funcionário agradeceu e lhe disse uma coisa que a incomodou e achou estranho ele disse: ¨Dona não pense muito, apenas abra¨, ela saiu achando que o funcionário deveria está bêbado, ela sai vai em direção ao carro encontra um garoto que pede dinheiro:
—Dona é natal, tem um trocado ai?
Ela estava com o troco do queijo, deu ao garoto que disse:
—Brigado dona, Feliz Natal!
Ela responde:
— Para você também!

Ela chega ao seu apartamento, corta o queijo, tira o peru do forno, abre o vinho coloca um pouco em uma taça e espera um pouco, já sabe que seus amigos, familiares irão ligar para lhe desejar feliz natal, ainda é cedo nove horas, nove e meia toca o telefone, seus parentes ligam, mas só para desejar feliz natal, mas ela não escuta, só escuta o barulho das crianças brincando, gritando, das pessoas falando, das músicas no telefonema ao fundo, elas espera as ligações que tem que receber e sempre responde com uma voz maquinal para você também são onze horas as ligações param.

A televisão ainda está ligada em um volume mínimo, ela toma mais um copo de vinho e escuta os o barulhos dos vizinhos festejando apartamento de cima, de baixo, ao lado, as luzes das casas iluminadas entrando pela janela da sala de estar, sem ninguém está lá, ela começa a arrumar a mesa acender as velas, come um pouco do peru, um pedaço de panetone. O queijo e o vinho sozinha na sala de jantar, ela não tem cão, não tem gato na casa o que torna ainda mais solitário o ambiente, ela não come tudo, o que sobrou ela embrulha e guarda para o porteiro. O porteiro agradece ela volta para o seu apartamento, ela entra e por um minuto, ela sente o silêncio, para depois voltar a escutar o som baixo da televisão e os barulhos ocasionais dos vizinhos, ela espera, a porta que não bate, o telefone que não toca mais, os barulhos que diminuem,

Levanta abre outra garrafa de vinho e vai para a sala, senta-se no sofá vai zapeando a os canais, o mesmo de sempre, especiais de natais dos anos passados, Roberto Carlos na TV Globo, um filme de Natal no SBT, zapear por outros canais, acha muito sem graça aquela alegria forçada, aquele frio e aquela neve dos filmes, nós estamos entrando no verão aqui no hemisfério sul, pensa...ela cai no sono o controle remoto cai da sua mão lentamente no sofá e na TV passa pela milésima vez o ¨Filme Milagre Na Rua 34¨ em algum canal a cabo.

Ela sonha, o quê? não sei, o que espera não sei, todo mundo espera algo, mas ela disfarçava bem, eu aqui do prédio vizinho observo tudo isso, daqui só dar para ver os pés dela e a televisão ligada em algum filme eu acho, ela dorme com a televisão ligada as duas da manhã do dia 25 de dezembro.

Dorme um sono tranquilo, o sono dos justos, se sonhou não sei, se pediu algum presente de natal também não sei, ela é acordada por um insistente barulho do interfone, acorda meio tonta e mal-humorada, e pergunta-se quem diabos pode ser a essa hora da manhã, irritada ela pergunta quem é, não ouve resposta, perguntou pela segunda vez já irritada quem é a voz veio do outro lado:
—Apenas abra.
 Quem é? Como assim apenas abra, eu não sei quem é e você me pede para abrir?
—Apenas abra!

Lembrou-se da frase do funcionário apenas ¨abra¨, ela abriu o portão contrariada e confusa, a surpresa que ela teve quando viu aquela pessoa.

Na porta estava eu, com um buquê de rosas e uma caixa de bombons e dois gorros de Papai Noel, eu sou o funcionário do supermercado e vizinho do prédio dela.
E entrei...